Prestes a fazer 28 anos, Sophie Charlotte protagoniza série como menina de 18
Era 2007. Aos 18 anos, Sophie Charlotte Wolf Silva estava prestes a passar por uma revolução pessoal. Depois de uma pequena participação em “Páginas da vida” como a bailarina Joyce, ela conquistava sua primeira protagonista numa novela: seria Angelina Maciel, na 15ª temporada de “Malhação”. A companhia da mãe, Renate Elisabeth, às gravações no Projac não se fazia mais necessária, porque a moça havia acabado de completar a maioridade. Era hora de assumir as rédeas da própria vida: deixar a casa dos pais, em Niterói, e encarar o dia a dia no Rio, dividindo apartamento perto do trabalho com uma colega do elenco, Carolinie Figueiredo. Mais do que tudo isso, fazia-se urgente abraçar o ofício de atriz e provar para o mundo que conseguiria sobreviver dessa paixão.
— Aquele foi um momento bem emblemático para mim, de ruptura e transformação. Eu queria conquistar um lugar de respeito na minha profissão, emendar bons personagens, provar para mim mesma, para a minha família e meus amigos que eu poderia me sustentar do que amava fazer, que não seria só um hobby. Estava sob os holofotes, e liberdade e responsabilidade se equilibravam: eu era dona do meu próprio tempo e das minhas escolhas, mas tinha que seguir horários, decorar textos, entender que eu tinha voz na sociedade como formadora de opinião. Fui acertando e errando, me perdoando, num processo de aprendizagem contínuo. A palavra que me definia era entusiasmo, eu me entregava mesmo. E, por isso, percebo que não mudei tanto assim — relembra a atriz.
Uma década depois, Sophie volta no tempo e, prestes a completar 28 anos (no próximo dia 29), retoma o frescor dos seus 18, mais uma vez como protagonista. Agora, da supersérie “Os dias eram assim”, que estreia nesta segunda-feira (17) na Globo, na faixa das 23h. Ela será Alice, uma estudante de Letras apaixonada por fotografia. No Rio de Janeiro dos anos 1970 e 80, onde as ideias conservadoras e a ditadura estão na mira de uma juventude inquieta, as características questionadora e libertária da personagem se sobressaem.
— Eu também sempre tive um gênio forte. Sou taurina, então a linha entre determinação e teimosia é tênue. Na pré-adolescência, principalmente, questionava a minha criação, as escolhas dos meus pais... Agradeço muito a eles pela paciência comigo (risos). Os dois respeitavam meus gostos e me deixavam pensar diferente deles. Acho que o balé, que pratiquei a minha vida toda, me ajudou a não pender para uma rebeldia, porque me deu disciplina, foco — analisa ela, que ganhou caracterização a la Jane Birkin (atriz e cantora inglesa que viveu na França dos anos 70) e Françoise Hardy (cantora e compositora francesa, bastante popular nos anos 1960) para o papel: — Alice faz parte da elite intelectual local, mas é uma menina simples ao mesmo tempo. Seus acessórios são somente um relógio de couro e botas. E, pela primeira vez, estou usando franja. Acho que isso me ajudou bastante a ficar com uma carinha mais nova... (risos)
Sob a supervisão da figurinista Marília Carneiro e do caracterizador Rubens Libório, a transformação do visual de Sophie foi feita por José Mário da Silva. De Belém do Pará, o cabeleireiro e maquiador é nada mais, nada menos do que pai da atriz de nome e sobrenome pomposos, com raízes internacionais.
— Eu nasci na Alemanha. Meu pai foi trabalhar lá e conheceu minha mãe, que é alemã mesmo, bióloga por formação. Os dois se casaram depois de seis meses juntos, foi um amor fulminante. Viemos morar no Brasil quando eu tinha 8 anos — relembra Sophie, que acha divertida a “criação diferente” que teve: — Toda essa questão da vaidade feminina, que envolve maquiagem e cabelo, eu aprendi com meu pai. Já minha mãe é uma mulher mais prática, me ensinou a mexer em fiação elétrica, a trocar lâmpada, a lidar com computação...
Nascida num 8 de março, Dia Internacional da Mulher, Renate Elisabeth Charlotte Wolf costumava comemorar seus aniversários em passeatas, lutando por seus direitos. A veia um tanto revolucionária parece ter sido herdada pela atriz, uma das funcionárias da TV Globo que vestiram a camisa da campanha #MexeuComUmaMexeuComTodas, dias após a figurinista Susllen Tonani acusar o ator José Mayer de assédio sexual.
— Eu cresci ouvindo essas histórias de militância da minha mãe. E vou dizer que agora, depois de ter sido mãe também, estou passando por um momento de transformação. É tanta coisa para entender, questionar, repensar... Um convite para uma roda de conversa sobre o filme “Primavera das mulheres” me despertou para os desafios da luta feminista. Me deparei com novas realidades. Se a gente pensar em pilares de poder numa sociedade, entende a necessidade não de uma igualdade entre homens e mulheres, mas de uma equidade. As questões de vida de um e outro são inevitavelmente diferentes, mas o respeito por ambos precisa ser igual — discursa ela, que afirma nunca ter sido vítima de abusos no trabalho, embora os tenha presenciado: — Recentemente, vi um caso de assédio moral, de preconceito. A vítima não fez nada, ninguém fez nada. Mas mexeu tanto comigo que prometi a mim mesma que não vou mais me calar. O que não é problema meu diretamente vai ser problema meu, sim.
A mãe de Otto, de 1 ano e 1 mês, sabe dos muitos desafios que tem pela frente ao prepará-lo para um mundo que se mostra cada vez mais agressivo, em todos os sentidos:
— Depois de um ano como mãe, comecei a sair dessa bolha de amor e simbiose, que vê tudo lindo, e abri os olhos para a realidade, para as coisas que têm que ser sedimentadas, conquistas que vêm desde a década de 70 e não se concretizaram. O feminicídio ainda é gigantesco, mas dentro da minha casa a equidade é uma realidade. Quando você cria um filho, repassa os seus valores. Fico muito preocupada com o mundo em que Otto e as outras crianças vão viver. A violência não está em guetos, mas em todos os lugares.
A responsabilidade pela educação do pequeno ela divide com Daniel de Oliveira, com quem está casada há um ano e quatro meses. Os dois se apaixonaram em 2014 durante as gravações do remake de “O rebu”, outra trama das 23h. E, agora, repetem o par romântico em “Os dias eram assim”. Na história, escrita por Angela Chaves e Alessandra Poggi, Alice (Sophie) é namorada de Vitor (Daniel), um advogado sem caráter, possessivo e perdidamente apaixonado por ela. Braço-direito do pai autoritário da moça, Arnaldo (Antonio Calloni), o rapaz se une ao futuro sogro num plano maquiavélico para afastá-la de vez de Renato (Renato Góes), um jovem médico ético e idealista por quem Alice se apaixona perdidamente.
— O melhor de trabalhar junto é que a gente vai poder tirar férias junto também — brinca Daniel, emendando numa declaração mais formal sobre a mulher: — É uma alegria imensa poder contracenar mais uma vez com Sophie, uma atriz de extremo talento e dedicação. Ela é muito estudiosa, gosta do jogo de cena, onde a cumplicidade é fundamental.
Sophie retribui:
— Eu amo Daniel! Fora o amor de homem e mulher, que todo mundo já está cansado de saber, eu o admiro muito como ator. Ele é muito surpreendente, vibrante, em cena. A gente estuda pouco o texto junto, porque, quando chego em casa, a minha prioridade é Otto. Se ele está dormindo ou foi passear na pracinha, eu corro para decorar o texto. Da mesma forma, quando estou aqui no estúdio, minha cabeça está totalmente voltada para o trabalho.
Diferentemente das mães que dizem se sentir culpadas por deixar o filho pequeno em casa, ainda amamentando, para voltar ao batente, Sophie afirma que retomar as gravações depois de quase dois anos fora — curiosamente, em “Babilônia”, ela também deu vida a uma Alice — tem sido mais prazeroso do que doloroso para ela.
— Os primeiros dias longe de Otto não foram tão complicados. Eu estava entusiasmada por voltar. Amo o que faço e trabalho também para poder dar o melhor para ele. Em casa, tenho uma rede de apoio maravilhosa, com as avós e a cuidadora. Não vou me encher de culpa.
Sophie conta que, só com a amamentação, eliminou os 20 quilos acumulados durante a gravidez. A boa genética e as poucas aulas de Pilates que tem conseguido fazer são também responsáveis pela boa forma física que vai exibir na supersérie, em cenas de biquíni e de nudez.
— É errado dizer que “retomei o corpo de antes da gestação”, porque nada mais é igual. Meu corpo gerou um bebê, fez o milagre da vida, não tem nada mais lindo e importante do que isso. Ele está diferente, e que bom que é assim. A gente tem que parar de falar como se saúde fosse igual a estética, a perder peso em pouco tempo depois de parir. Quantas mulheres sofrem com esse discurso em prol da magreza? — defende ela, que não vê problemas em se expor em takes mais ousados: — A gente está contando uma história de amor, e o sexo faz parte disso. Então, para mim, faz todo sentido. Estou disponível a ficar nua se tiver um contexto.
— Quando começo a trabalhar num projeto, me envolvo totalmente, tento fazer o melhor. Carlinhos (o diretor artístico Carlos Araújo) veio com essa ideia e eu adorei. Ouvimos a versão da Elis, que é superemocionante, e, guardadas as devidas proporções, colocamos todo o nosso afeto ali também — conta ela, entregando que ainda fica tensa na hora de soltar a voz em público: — Interpretando, fico por trás de um personagem. Já cantar é algo muito pessoal, é me expor em outro lugar. Estudei canto com o meu avô materno, Curt, um alemãozão que era cantor lírico. Foi uma maneira linda de a gente se aproximar. Ele já se foi, tenho muita saudade... Talvez por isso a música tenha um valor sentimental enorme para mim.
Fotografia é outra arte de que a atriz precisou se aproximar para a nova série. Há mais de dois meses, ela vem tendo aulas (veja quadro na página 9) para aprender a manusear uma câmera profissional, já que num segundo momento da trama Alice vai transformar a paixão pelos cliques em profissão.
— Já tirei umas fotos lindas do Otto! Quero ampliá-las em papel e fazer álbuns para ele. Fotografia digital vira arquivo, se perde com facilidade, não tem tanta graça — explica a atriz, já inserida num universo retrô: — Este novo trabalho tem feito eu descobrir prazeres de antigamente. E eu estou adorando isso!
Em “Os dias eram assim”, fotos em PB de sombras, detalhes, pés e outros temas subjetivos serão mostradas como se tivessem sido feitas por Alice. Na verdade, os cliques são de autoria da fotógrafa carioca Gabi Carrera, de 34 anos. Ela tem acompanhado Sophie nas gravações e ensinado a atriz a manusear uma câmera profissional analógica. “O olho no visor, a fotometragem, o foco... Dou todas essas dicas para ela, que tem se mostrado muito interessada. Já marcamos de revelar juntas algumas fotos feitas por ela fora de cena. Nossa parceria flui superbem”, conta Gabi, que diz não se importar ao ceder o crédito de suas fotos a outra pessoa: “Não é um incômodo não ser reconhecida como a autora das imagens. Costumo fotografar obras de arte, e o foco é sempre a obra do artista, não a minha”.
Qual imagem mais remota tem de si mesma?
Dia desses, eu estava ninando Otto e me veio a sensação de estar sendo ninada, quando bebê. De relaxar o corpo nos braços da minha mãe.
A imagem de maior alegria da sua infância é...
Meu pai tem um sítio perto de Itaboraí até hoje. Quando criança, eu e meus primos ficávamos eufóricos quando chegávamos lá.
E na fase adulta?
O nascimento do meu filho e o meu casamento, festa que eu mais curti na minha vida.
A imagem mais triste que seus olhos já viram?
O rosto do meu irmão, Ângelo (hoje com 24 anos), quando ele recebeu a notícia de que um amigo tinha morrido num acidente de carro.
A que a deixa orgulhosa?
Uma de qualquer conquista de Daniel. Sinto muito orgulho dele, fico boba mesmo.
Qual seria o retrato do aconchego?
Eu no colo macio da minha avó.
Uma imagem inesquecível de Otto...
São muitas! As carinhas que ele faz, o jeito de ele andar e de falar “papai” e “mamãe”, ele me olhando nos olhos enquanto mama...
Eleja um clique eternizado do seu amor!
Quando a gente estava ensaiando para fazer “O rebu”, Daniel olhou para mim e soltou “Nó!”. Ali começou a paixão.
Fonte: Jornal Extra Globo
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