Sophie Charlotte e Daniel de Oliveira de “O Rio do Desejo” falam sobre o filme gravado na Amazônia
Obra adaptada do conto “O Adeus do Comandante”, do escritor amazonense Milton Hatoum, ‘O Rio do Desejo’ terá sessão de pré-estreia hoje, às 20h, no Teatro Amazonas. O filme é estrelado pelos atores Daniel de Oliveira e Sophie Charlotte que, junto ao diretor Sérgio Machado, concederam entrevista à Folha de Parintins, onde falaram sobre a produção, a nova retomada do cinema brasileiro e o que esperar do filme, que chega às telonas no próximo dia 23 de março.
Texto e entrevista cedido ao site Folha de Parintins, todos créditos a eles.
Texto e fotos: Roger Matos
Folha de Parintins – Sophie, qual o significado de rodar um filme na Amazônia, no Amazonas, nesses tempos em que a região está em evidência?
Sophie Charlotte – É de profunda reverência e reconexão também com a minha própria ancestralidade. A força da mulher nortista, para mim, tem um significado muito grande, pelas minhas origens também nortistas. Poder mostrar na tela, com a fotografia do Tejido, no filme do Sérgio, a Amazônia do jeito que ela está, com a sua potência, com a sua vastidão, o seu poder, perto dessas questões humanas que o filme aborda, dessa ligação do desejo e do natural, sem esse falso moralismo, quer dizer, o que é a riqueza dessa mata de pé e o que ela vem a nos ensinar também. É um filme que se desdobra em significados e, para mim, tanto como atriz quanto mulher, foi esse o processo. Até hoje, tem momentos que eu lembro de passagens, o quanto amadureci durante o processo da feitura desse filme, e até agora ainda tenho muitas fichas caindo, muitas coisas que ainda estou entendendo.
Folha de Parintins – Daniel, o cinema brasileiro passa por muitas fases, evoluções e momentos que mostra que ainda precisa evoluir. Nos últimos anos, foi minado por um governo que sufocou a cultura como um todo. Como você vê, a partir dessa produção e do que já vivenciou em outras produções, a retomada do cinema brasileiro com o retorno de um ministério voltado para isso – o Ministério da Cultura?
Daniel de Oliveira – Ainda bem! Estamos retomando um ministério tão importante, que não deveria ter se perdido nunca, porque é o Ministério da Cultura. A gente está falando de um país desse tamanho, então a gente não pode perder esse ministério. Que bom que está voltando agora essa maior responsabilidade, porque além de tudo, além de contar a nossa história através das histórias que a gente cria para o cinema, a gente está contando a história de um país mesmo. A gente tem que ter a cara através da cultura também. E sem falar que gera emprego pra caramba, que atrai investidores, investimentos. Você vê que o americano é craque de fazer isso, o cara roda um filme lá em São Francisco, você fica doido pra ir lá em São Francisco. Então o camarada faz um filme aqui na Amazônia, aí o camarada lá da Suíça, da Bélgica, o Sérgio vai pra Estônia, a gente esteve na Estônia, o camarada olha aquela exuberância, aquela floresta, e vai falar “eu quero ir pra lá, como é que eu faço pra ir pra lá?”. Então, de repente estar aqui… O cinema é importantíssimo, assim como todas as artes.
Folha de Parintins – Sérgio, o filme fará sua pré-estreia hoje no Teatro Amazonas, que é um símbolo da nossa região e as pessoas que vêm ao Estado, vêm com esse desejo de conhecer o teatro. O que simboliza esse marco para a produção?
Sérgio Machado – Exibir o filme no Teatro Amazonas é a concretização de um sonho. Para mim, essa sessão de hoje tem um sentido simbólico muito longe, muito bonito. Como o Daniel falou, a gente está vivendo, saindo de uma arapuca, de um momento terrível. Não é que o governo abandonou a cultura, ele fez tudo que pôde para sufocar a cultura. Então, foi um período muito terrível. E um país que não tem cinema é como se fosse uma casa que não tem espelho. Você não consegue ver a sua própria imagem. E aí a imagem que você tem de si mesmo é que o outro projeta, você vai virar uma caricatura de si mesmo. Então, a gente passou por um momento muito terrível. Agora, a gente é artista e os artistas brasileiros são fênix, são mais fortes do que esses caras que lutam para destruir a gente.
Folha de Parintins – O filme é baseado na obra de um escritor amazonense, que é Milton Hatoum? Já conhecia a obra dele?
Sérgio Machado – Sim. Toda vez que eu faço um filme, eu fico pensando: qual é o público desse filme? Eu queria que as pessoas que estão retratadas naquele filme, elas se vissem ali e se sentissem respeitadas. Então, de certa forma, o meu público alvo é o povo do Amazonas. A gente foi muito feliz, a gente ficou apaixonado pelo Amazonas e tomara que o Amazonas se apaixone pelo filme.
Daniel de Oliveira – É sempre a retomada.
Sérgio Machado – A gente retoma e, curioso, na outra retomada, retomou mais forte. Acho que agora, de novo, a gente estava falando disso, da necessidade de lançar esse filme grande, bonito, de festejar como a gente vai fazer agora para acabar com essa zica toda que estava por aí.
Folha de Parintins – Dentro de alguns dias, “O Rio do Desejo” vai para as telonas e muito mais brasileiros terão a oportunidade de assistir. O que o brasileiro, amante de cinema, pode esperar do filme?
Sophie Charlotte – O filme que fala dessa magia de encontro, do que é a paixão e, ao mesmo tempo, desse terremoto, dessa confusão que pode ser um estado de apaixonamento, ainda mais quando ele não segue uma métrica moral tão definida. É uma história de paixão, de liberdade e que tem um feminino muito pulsante, muito central, que revoluciona. Esse símbolo de um feminino revolucionário que joga a luz, joga a vida dentro de uma casa abandonada pode ser também uma boa metáfora para esse momento de retomada, para jogar a luz para os próximos anos, para a gente voltar a olhar para a nossa floresta, sabendo da importância dela, voltar a olhar para o Norte e respeitar toda essa região tão rica, com a floresta em pé, dos povos originários, dos povos ribeirinhos, enfim… O cinema, como o Sérgio falou do espelho, é realmente essa janela, esse portal para o Brasil e para o mundo apreciarem e respeitarem ainda mais essa região.
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