Sophie Charlotte é estrela de revista e comenta sobre relação com Gal Costa: “Sempre foi muito clara aos limites dela"
Sophie Charlotte acredita em chamados. Quando confia, abraça a faísca de cada trabalho: “tinha de acontecer naquele tempo e instante”, diz, com ar intuitivo. Se as oportunidades não batem à porta, corre atrás. “Nunca se sabe quando um projeto vai te influenciar, revolucionar ou fazer você se reinventar”, afirma a atriz de 33 anos, cover girl de Bazaar neste Mês da Mulher.
Nos cliques, assim como na vida e na atuação, deixa o real e o lúdico se embaraçarem na busca por identidade. Topou de bate-pronto descolorir as sobrancelhas para encarnar a personagem deste ensaio e não hesita em radicalizar nas mudanças físicas para uma produção. “É uma forma de busca pessoal dos meus traços, beleza, cabelo e jeito e, ao mesmo tempo, abre caminho para outras possibilidades se manifestarem”, observa.
Por tamanho desprendimento, atitude e força de atuação, Sophie foi a escolhida para viver a protagonista de um dos filmes mais aguardados e comentados deste ano: a cinebiografia “Meu Nome É Gal”, com estreia prevista para setembro. Na pele (e alma) da cantora, que morreu em novembro passado, ela conta que não hesitou quando recebeu, por telefone, o convite para estar no longa. Não perguntou nada. Disse um “sim imediato”. À época, não havia nem o roteiro, que é pautado pelo período do álbum “Fa-Tal – Gal a Todo Vapor”, da década de 1970.
Durante o processo, teve o privilégio de conhecer a cantora, ir a todos os shows enquanto conseguiu e a encontrou para jantar algumas vezes. Reservada, ela permitiu essa aproximação fundamental para a construção da personagem. “Gal sempre foi muito clara aos limites dela, o jeito de dividir pouco sua vida, se permitindo a privacidade”, relembra a atriz. “Eram diálogos sobre o que revela e guarda, acho genial como (ela) sempre conseguiu ser fiel à própria vontade”.
Sophie aproveitou a vivência do marido, o ator Daniel de Oliveira, que interpretou o elogiadíssimo “Cazuza – O Tempo Não Pára” (2004) nos cinemas, para ouvir histórias de seu processo como protagonista. “Ao mesmo tempo, me deixou muito à vontade para descobrir o meu caminho”. Debruçou-se sobre os fonogramas e as histórias de Gal contadas através de cada faixa e álbum. “Sei de muitos fãs da Gal fissurados. O coração acelera só de pensar: ‘caramba, isso vai chegar nessas pessoas’. Espero que o filme tenha esse amor e respeito que todos cultivamos por ela e por sua obra”.
Guardará para sempre tudo o que Gal a aconselhou. “Isso é nosso”. Para interpretar a voz de cristal, pediu ao joalheiro e amigo André Lasmar que criasse um anel inspirado em uma joia dos idos de 1960 e 1970. Usou nas gravações do longa e no Bloco Baixo Augusta, durante o Carnaval. Sinônimo de força, é quase um amuleto.
Sophie esbanja projetos até o fim do ano com seu nome nos holofotes. No dia 23 deste mês, estreia nos cinemas o drama “O Rio do Desejo”, dirigido por Sérgio Machado e inspirado no conto “O Adeus do Comandante”, de Milton Hatoum. Ela interpreta Anaíra e faz par romântico com o marido da vida real que vive Dalberto, e divide-se em um triângulo amoroso com Gabriel Leone (Armando) no roteiro de mergulho profundo no desejo feminino. “Trouxe reflexão sobre o que se espera (da mulher) e como pode ser revolucionário, transformador e trágico, também, viver a sua própria potência. Muitas vezes, o mundo não está preparado”.
A tríade desejo, poderes da natureza e da mulher fizeram parte da experiência ao se mudar temporariamente para Itacoatiara, no Amazonas, uma cidade na região metropolitana de Manaus. “Foi maravilhoso”, exclama, afirmando que a comunidade os abraçou. “A Amazônia é nossa, é brasileira, a gente precisa valorizar e entender a importância da floresta em pé. Que venham novos fomentos à cultura nesse momento mais luminoso para realizar projetos assim”.
Do Brasil direto para Hollywood. Sophie ainda estará no suspense “The Killer”, adaptação do quadrinho homônimo com Michael Fassbender no papel principal e previsto para chegar à Netflix em novembro. “David Fincher (diretor) é genial mesmo. Poder conviver com ele, sua equipe, contracenar e conversar foi um sonho”, narra.
Só acredita pois voltou três vezes para filmar. Estar ali comungando do fazer artístico – mesmo em outra língua – na hora do “ação” até o “corta” é onde se sente confortável. “Meu exercício foi conseguir transformar tanta adrenalina em espaço interno para acontecer a cena. Quando você fica tomado por um nervosismo, você nem aproveita, né?”, desabafa.
Nessa jornada de aventura, Sophie equilibra muitos pratinhos sem romantizar a exaustão. Sua aparição mais recente na TV foi em “Todas as Flores” (Globoplay), novela em que interpreta Maíra Cruz, deficiente visual que ajudou a tirar véus de preconceitos. “Não só meus, como das pessoas que assistiram e acompanharam minha função de artista realizando esse trabalho”, detalha. A novela chega no segundo semestre à TV aberta na Globo e caminha para a segunda temporada na plataforma de streaming.
Casada há quase uma década, mantém com Daniel Oliveira uma rotina privada, justamente onde mora parte do segredo de estarem juntos há tanto tempo. “Nossa história é de parceria, entendimento do tempo e da passagem do tempo no outro”, explica sobre o relacionamento com início nas filmagens da novela ‘O Rebu’. Entre tanto em comum, compartilham o amor pela natureza, fundamental para desopilar a mente”, ela diz. Gostam de ir à praia, mergulhar, tomar um banho de cachoeira. “Consigo desligar, resetar e focar em outra coisa”.
No lockdown, em sua casa no Rio de Janeiro, pode ficar mais próxima do filho Otto, prestes a completar 7 anos, em uma rotina atípica para quem trabalha fora desde os 18 anos. Aproveitou para ressignificar o entendimento do feminino, sobretudo pelo papel de mulher e de mãe. Aprendeu a cozinhar “bem” e hoje gaba-se do menu: de moqueca e bacalhau a risotos variados.
A inspiração vem de suas avós, uma paraense, outra alemã. Transita nesses dois universos absolutamente distintos e ama. Também graças a elas, Sophie sabe costurar, bordar… Foi reformando coisas em casa, inventando receitas e bolos, cuidando da horta e até tirou do papel um antigo projeto de uma mesa. Lembra daquela faísca do início do texto? É a vontade de se enveredar pelo novo que a faz optar por caminhos misteriosos, mas sempre certeiros.
Fonte: harpers bazaar
Fotos: Juliana Rocha
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